quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

A educação brasileira e o Pisa

MARCELO MITERHOF
Parte do avanço do país na avaliação se deve aos avanços nas condições socioeconômicas dos alunos
A coluna retrasada discutiu a relação entre educação e produtividade. A conclusão foi que os problemas da primeira não são uma restrição tão severa ao aumento da última, ao menos em horizontes mais curtos, pois o principal mecanismo de ganho de produtividade é o investimento, que depende da demanda.
Contudo, além de ter efeitos de longo prazo sobre a produtividade, a educação é antes de tudo uma missão civilizatória, que por si só melhora a qualidade de vida.
Nesse sentido, saiu na semana passada o resultado do Pisa de 2012, a avaliação internacional de estudantes. O Brasil continua na rabeira, mas persiste melhorando.
O relatório da OCDE, que reúne os países desenvolvidos e alguns outros, aponta que a nota brasileira em matemática subiu de 71,2% da média da OCDE em 2003 para 79,15% em 2012, maior ganho entre todos os países. Nesses anos, a matemática foi o foco do exame. Também é destacado que o Brasil teve melhoras relevantes em leitura e ciências.
Mais importante, esse ganho se deve principalmente à elevação das notas dos estudantes de pior desempenho. Parte disso se deve aos avanços nas condições socioeconômicas desses alunos, o que favorece a tese da coluna retrasada de que o desenvolvimento melhora a educação.
É difícil avaliar uma situação que se move a partir de um desastre, como é o caso da educação no Brasil. Um pessimista pode dizer que a foto continua ruim e um otimista facilmente aponta melhoras.
Entretanto, há razões para acreditar que o Brasil continuará melhorando.
O gasto público com educação no Brasil cresceu de 2005 a 2010 de 4,5% para 6,1% do PIB, praticamente toda a elevação na educação básica, segundo dados oficiais. Esse é um indicador consagrado de esforço, porém é claro que os indicadores de resultado também são relevantes.
O Pisa é feito com alunos de 15 anos, com até dois anos de atraso escolar. Nessa idade, o Brasil ainda não terminou o esforço inclusivo. Em contraste aos 98% de abrangência do ensino fundamental, a Pnad aponta que em 2012 a frequência escolar da população de 15 a 17 anos foi de 84,2%, sendo que 56,4% estavam, como deveriam, no ensino médio regular.
Seguir na universalização é crucial e precisamos acelerar tal processo: em 2005, essa frequência era de 81,7%, com 48,3% no ensino médio. Mas, como ela ocorre entre os alunos mais vulneráveis, de início o resultado no Pisa é prejudicado. Assim, Andreas Schleicher, coordenador do Pisa, ressaltou que o caso brasileiro é notável por conjugar melhora no desempenho com inclusão de alunos.
Outro indicador importante é o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Instrumento de avaliação e planejamento, criado em 2005 pelo governo federal, o Ideb é mais abrangente que o Pisa, não só testando o conteúdo como também controlando o fluxo dos alunos. Para ser bem avaliada, uma escola precisa conjugar boas notas de seus estudantes com baixa reprovação.
O Ideb dos alunos do 5º ano do ensino fundamental está crescendo mais que o dos estudantes do 9º ano. Isso é o esperado porque os mais novos frequentaram a escola desde o início sob a égide do Ideb. Ao fazerem o Pisa daqui a alguns anos, provavelmente terão resultado melhor.
Isso não significa que tudo está equacionado. Por exemplo, numa decisão contrária ao sentido de suas políticas como ministro da Educação, o prefeito Fernando Haddad acabou com os ciclos escolares no ensino fundamental, cedendo à pressão de professores e de pais de alunos, preocupados com o real aprendizado de seus filhos na ausência do risco anual de reprovação.
Porém a avaliação pedagógica indica que essa reprovação atrapalha o fluxo escolar, levando alunos a abandonar os estudos. O ponto é que a ausência de reprovação anual não deve eximir a escola de fazer provas regulares para que as deficiências de cada aluno sejam identificadas e passem a ser alvo de aulas de reforço, evitando que estudantes fiquem para trás no aprendizado.
Isso exige intensificar o esforço pedagógico e o investimento público, sendo um dos caminhos críticos para a melhoria da educação.
Há ainda problemas como os relacionados à dificuldade de melhorar a qualidade dos professores e tornar a profissão mais atraente, discutido na coluna "A missão da educação", de 06/06/2013, e às desigualdades regionais na educação.
Sigo no tema semana que vem.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Na educação, Brasil tem motivos para celebrar e para se preocupar: Jornalista visitou os melhores sistemas escolares do mundo e concluiu que a eficiência está no ensino desafiador e em professores bem preparados

FABIANO MAISONNAVEDE SÃO PAULO
Ao topar com um gráfico comparativo da evolução educacional em 15 países ricos, a jornalista dos EUA Amanda Ripley, 39, viu sem surpresa, que, em meio século, quase nada mudou no desempenho medíocre dos alunos da nação mais rica do mundo. Mas lhe serviu como revelação a melhora apresentada em lugares como Finlândia e Coreia do Sul em apenas uma década.
Ripley decidiu, então, acompanhar alunos americanos de intercâmbio em três países bem avaliados no Pisa --reputado teste internacional de desempenho de alunos entre 15 e 16 anos em matemática, leitura e ciências. Do mais recente participaram de 65 países, com o Brasil nas últimas colocações.
Na Finlândia, a jornalista encontrou crianças que "alcançam alto grau de pensamento sem competição excessiva ou interferência paterna". O contrário da "panela de pressão" sul-coreana, onde as jornadas escolares já tiveram 16 horas. Na Polônia, o fim do comunismo criou uma escola mais rigorosa, porém estimulante.
As conclusões estão no recém-lançado "The Smartest Kids in the World" (As crianças mais inteligentes do mundo, em tradução livre), que está na lista dos cem livros "notáveis" deste ano do "New York Times". O lançamento no Brasil será em 2014. Confira trechos da entrevista concedida à Folha, por telefone.
FOLHA - A sra. diz que o Pisa é um bom método de avaliar o pensamento crítico. O que isso significa do ponto de vista educacional?

Amanda Ripley - Eu mesma fiz o teste enquanto escrevia o livro. Ele requer mais pensamento do que qualquer outro teste padronizado que conheço. Exige que um problema do mundo real seja traduzido em termos matemáticos. Que você critique um trecho de leitura e diga como ele pode ser melhorado. É uma avaliação com base na qualidade do argumento.

A partir do Pisa, a sra. escolheu visitar três países bem diferentes entre si. O que eles têm em comum?
Acompanhei três adolescentes americanos, de Estados diferentes, e que foram a três países muito diferentes também. Todos notaram que as crianças desses países levam a escola mais a sério do que nos EUA --justamente pela escola ali ser mais séria. O trabalho que fazem é mais desafiador, os professores são mais bem treinados e o foco é no aprendizado.
Nos EUA e em outros países está menos claro para que a escola serve. Entrevistei centenas de alunos de intercâmbio nos EUA, e 90% disseram que as escola americana era mais fácil. Disseram ainda que havia mais tecnologia, o que é importante apenas na medida em que há muito investimento nessa área no país, e é preciso um retorno. Porém, ter iPads em sala de aula não leva necessariamente ao aprendizado.

Qual é a importância do professor?
Anos de pesquisa têm mostrado o que, no fundo, já sabíamos: o professor é o fator intraescolar mais importante na educação. Alguns países concentram toda a energia no recrutamento, treinamento e aprimoramento dos professores. Esses países são poucos e distantes entre si, mas parecem ter sistemas mais justos, com crianças mais inteligentes.

Uma de suas conclusões otimistas é que o sistema educacional pode mudar rapidamente. Isso é verdade mesmo em países grandes?
Acho que sim. Escrevi este livro porque as mudanças são muito estimulantes. É muito encorajador ver países grandes e complexos, como Polônia, Canadá e mesmo partes da China melhorarem dramaticamente o que as crianças podem fazer em dez anos, que não é um período muito longo.
Mesmo nos EUA, há dois Estados, Massachusetts e Minnesota, onde nossa performance é de muito alto nível em comparação com o resto do mundo.

No Brasil, o governo comemorou ter sido o que mais avançou em matemática desde 2003, mas o país continua nas últimas posições. Há mais motivos para celebrar ou para se preocupar?
Não saberia interpretar os resultados do Brasil, mas o país ainda tem um longo caminho adiante, assim como outros países na América do Sul. Mas há muitas nações que não estão nem perto do Brasil ou que estão piorando. No caso brasileiro, há bons motivos para comemorar e motivos para gerar ansiedade e preocupação.

O sistema educacional mais exigente parece ser o sul-coreano. Ele deve ser copiado?
Há lições a serem aprendidas, mas não é o modelo ideal para nenhum país. O caminho é extremamente infeliz --muito eficiente, porém doloroso. Você não vai querer ter dois sistemas escolares, um de dia, outro de noite [aulas de reforço], e os alunos assistindo a ambos. É melhor investir num sistema escolar durante o dia confiável a pais e alunos. Lá todos me diziam que o modelo finlandês é o melhor para o mundo.

A sra. diz que o rigor com o aluno é parte importante do sistema educacional eficiente. Isso explicaria a diferença entre escolas privadas de elite e escolas públicas no Brasil?
O último Pisa é o primeiro a mostrar que as escolas privadas estão agregando valor em todo o mundo. Isso é preocupante, porque o acesso à educação não deveria ser baseado em quanto dinheiro os pais têm.
Sobre o rigor, os sistemas mais humanos e de alta performance são os que priorizam qualidade sobre quantidade. Portanto, o objetivo não é gastar muitas horas na escola e muitas horas fazendo tarefa de casa. O objetivo é que o tempo usado seja desafiador, com trabalho difícil que valha a pena fazer. Muitos americanos fazem mais lição de casa que os finlandeses. Mas não é muito criativo ou exigente, é apenas para mantê-los ocupados.

A surpresa do ano foi o Vietnã, país pobre que teve um desempenho melhor do que países ricos. O que explica?
Não sei muito sobre o Vietnã, mas fiquei impressionada com a performance do país. Tem o mesmo nível da Finlândia, Canadá e Holanda, apesar da pobreza. O que eu sei é que, como a Coreia do Sul, há muita aula de reforço depois da escola. É algo com que você tem de ser cuidadoso, ninguém quer que as crianças sejam tristes, estudem dia e noite. Especialmente porque países como Finlândia, Alemanha e Canadá estão no topo sem serem infelizes.

Se a sra. pudesse voltar no tempo, onde faria o ensino médio?
Definitivamente, não seria na Coreia do Sul. É um país fantástico e interessante, mas o sistema é muito esgotador.
Eu estudei no exterior quando era adolescente. Como muitos jovens, estava desesperada para sair da minha escola, então eu embarquei na chance de passar um semestre na França.
O país não tem um forte sistema educacional em relação ao topo do mundo, mas foi uma das melhores decisões que eu tive na minha vida. De repente, entendi que o mundo era um lugar grande, que não gira em torno dos EUA --uma grande conclusão para um norte-americano.

Fonte: Folha, 09.12.13



quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Ranking THE: USP é a 11ª melhor entre países emergentes Brasil tem quatro universidades entre as 100 melhores; China lidera

Ranking britânico THE avaliou pela primeira vez instituições dos Brics e de mais 17 nações 'em ascensão'
SABINE RIGHETTIDE SÃO PAULO
Há quatro universidades brasileiras entre as cem melhores dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e de outros 17 países emergentes. Mas nenhuma delas está no topo da lista.
A análise --primeira desse tipo-- foi divulgada ontem pelo britânico THE (Times Higher Education), que também elabora o principal ranking de universidades do mundo.
A USP aparece em 11º lugar na lista. Antes dela, há instituições da China, da África do Sul, de Taiwan, da Turquia e da Rússia.
"A avaliação mostra que é fundamental ensinar em inglês", analisa o físico da Unicamp e especialista em ensino superior Leandro Tessler.
"Todas as top 10' ensinam em inglês. A primeira da lista que não ensina em inglês oficialmente é a USP."
Além da USP, também aparecem no ranking as brasileiras Unicamp (em 24º lugar), a UFRJ (60º) e a Unesp (87º).
A China, que lidera a classificação, tem 23 universidades listadas --quatro delas entre as dez melhores.
"O mais trágico para o Brasil é só ter quatro entre as cem melhores", avalia Tessler.
De acordo com Fran Langdon, do THE, os 22 países analisados têm investido grande quantidade de recursos públicos em ensino superior.
"Decidimos fazer uma análise específica de emergentes porque sabemos que o investimento em universidades faz parte da estratégia desses países", diz Langdon.
"Muitas dessas instituições não ficam visíveis nos rankings internacionais."
É o caso do Brasil: o país despareceu da lista do THE de 200 melhores universidades do mundo neste ano.
No ano passado, a USP, única que figurava na lista, ocupava o 158º lugar na classificação mundial de escolas.

VEJA O RANKING
1 Univ. de Pequim (China)
2 Univ. de Tsinghua (China)
3 Univ. da Cidade do Cabo (África do Sul)
4 Univ. Nac. de Taiwan (Taiwan)
5 Univ. Bogazici (Turquia)
6 Univ. de Ciência e Tecnologia da China (China)
7 Univ. Tecnológica de Istambul (Turquia)
8 Univ. de Fudan (China)
9 Univ. Técnica do Oriente Médio (Turquia)
10 Univ. Lomonosov (Rússia)
11 USP
24 Unicamp
60 UFRJ
87 Unesp
    Ciência é a pior área entre alunos brasileiros
    País não avançou em três anos no Pisa
    DE SÃO PAULODE BRASÍLIA
    Ciências é a matéria em que os alunos brasileiros estão mais defasados em relação aos outros países, aponta o Pisa, exame internacional de estudantes.
    Essa é a disciplina em que o país tem seu pior desempenho (59º entre 65 países). E ainda não obteve avanço nos últimos três anos (2009-2012).
    Em matemática, o Brasil foi o 58º; em leitura, 55º.
    Os alunos avaliados, das redes pública e privada, têm entre 15 e 16 anos (ensino médio). Os dados foram divulgados anteontem pela OCDE, organização de países desenvolvidos que aplica a prova.
    Entre os seis níveis em que os alunos são distribuídos, o Brasil teve apenas 0,3% nos dois mais elevados em ciências. A média dos países desenvolvidos foi de 8,4%.
    A maioria dos estudantes brasileiros ficou nos dois patamares mais baixos. Não souberam, por exemplo, explicar por que crianças e idosos são públicos prioritários na vacinação contra a gripe (a resposta é porque eles têm menos resistência ao vírus).
    Para a diretora-executiva da ONG Todos pela Educação, Priscila Cruz, um dos motivos que podem explicar o baixo desempenho em ciências é a falta de ênfase no problema dessa disciplina.
    Em matemática, diz ela, as dificuldades foram notadas há mais tempo e, por isso, as médias têm aumentado.
    A carência de laboratórios, o ensino muito teórico e a baixa atratividade da carreira docente são os fatores apontados pelo físico Luiz Davidovich, da diretoria da Academia Brasileira de Ciências.
    "Há exceções, mas, de forma geral, não há estímulo à curiosidade, à criatividade."
      Fonte: Folha, 05.12.13

Cade recomenda restrições à fusão que criou gigante do ensino no país: Órgão considera que união entre Anhanguera e Kroton gera concentração em alguns municípios

Superintendência-Geral vê risco a alunos, como aumento de preços; Kroton diz que buscará solução negociada
RENATA AGOSTINIDE BRASÍLIA
A Superintendência-Geral do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) detectou problemas concorrenciais na fusão entre os grupos de educação Anhanguera e Kroton, anunciada em abril, e recomendou a aplicação de restrições à operação.
A incorporação da Anhanguera pela Kroton, avaliada em R$ 5 bilhões, criou uma gigante global do ensino, com quase 1 milhão de alunos no país. A Kroton Educacional tem 534.392 estudantes, e a Anhanguera, 428.779.
Para o órgão, a união gera alta concentração em três municípios no segmento de ensino presencial e em 55 municípios na educação à distância --incluindo cursos que são oferecidos nacionalmente e os ofertados só localmente.
O parecer do órgão foi publicado ontem no "Diário Oficial da União". Caberá ao Tribunal do Cade analisar a recomendação e julgar quais devem ser as restrições. O Cade pode aplicá-las unilateralmente ou por meio de acordo com as empresas.
Os locais com problemas concorrenciais reúnem 2,7% do total de alunos das duas empresas juntas no segmento presencial. Já a concentração no ensino à distância foi verificada em 171 cursos, que reúnem cerca de 6% do total de alunos das companhias.
Após o anúncio da fusão, a Kroton indicou que havia sobreposição das operações em quatro municípios no ensino presencial, concentração avaliada como baixa por seus executivos na época.
De acordo com a Superintendência-Geral do Cade, se a operação for aprovada sem restrições, haverá risco de prejuízo aos alunos dos cursos e dos municípios, como aumento de preços, redução da oferta de serviços e queda na qualidade de ensino.
Isso porque as instituições concorrentes de Kroton e Anhanguera não seriam capazes de oferecer rivalidade suficiente nos mercados em que foram detectados os problemas concorrenciais.
A avaliação é que as duas companhias, devido à escala e à capilaridade, têm vantagens na captação de alunos, no catálogo de cursos oferecidos e nos preços.
A Kroton comunicou a seus investidores que as companhias buscarão uma solução negociada "tão logo seja possível" para afastar preocupações concorrenciais e obter a aprovação do acordo.
Cade mantém multa à Anhanguera por omissão de dados na compra de empresas


O triunfo da mediocridade

CLÓVIS ROSSI
Reação ao desastroso resultado do Brasil no exame Pisa mostra uma mentalidade pequena
Qual foi a pior notícia da sequência de números sobre o Brasil divulgados nas últimas 48 horas?
Para mim, não foi o 72º lugar na lista da Transparência Internacional. Trata-se apenas da confirmação de que 20 anos de governos dos dois partidos que se arrogavam o monopólio da virtude, PSDB e PT, não tiraram o Brasil da podridão secular.
Tampouco foi a última colocação no campeonato mundial de crescimento econômico. O retrocesso do terceiro trimestre já estava cantado e, portanto, só se espanta quem não presta atenção às coisas básicas.
Nem foi a desastrosa colocação no Pisa, o principal exame internacional de educação básica. Quem passou uma vez na calçada de qualquer escola pública e até de algumas particulares já sabia que não poderia ser muito diferente.
Pior que tudo isso foi a reação do ministro da Educação, Aloizio Mercadante, que, na CBN, considerou o resultado "um grande triunfo".
Essa avaliação é, isto sim, um triunfo da mediocridade que caracteriza a maior parte dos homens públicos brasileiros. Preferem sempre fazer propaganda em vez de reconhecer os fatos como os fatos são.
E como são os fatos? Responde Paula Louzano, pesquisadora da Faculdade de Educação da USP, em artigo para esta Folha:
"Quase 70% dos nossos jovens não sabem suficientemente matemática para continuar aprendendo na escola ou mesmo competir no mercado de trabalho, segundo padrões da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que reúne países industrializados). Isso porque eles não são capazes, entre outras coisas, de usar a informação de uma tabela ou de um gráfico para calcular uma média ou uma tendência".
Poderia ser pior, sempre segundo Louzano: "É ainda mais grave constatar que 23% dos brasileiros de 15 anos não participaram do Pisa. Esta é a parcela de jovens que estão fora da escola ou têm mais de dois anos de atraso escolar. Ou seja, se todo esse contingente estivesse na escola como deveria, os resultados brasileiros poderiam ser ainda piores".
Até entendo que o ministro não poderia vir a público e dizer "fracassamos mais uma vez". Fingir que tudo vai bem faz parte do jogo dos governantes, mas ele poderia ao menos fingir com algum pudor, em vez de dizer que "nosso filme é muito bom". Fica ridículo.
Espero que, longe de câmeras e microfones, o pessoal do MEC avalie honestamente as causas do fracasso.
Contribuição para essa eventual avaliação, extraída de artigo para "El País" de Jaime Rivière, professor de Sociologia da Universidade de Salamanca.
Ao tentar entender os bons resultados dos países asiáticos, ele aponta como uma das possíveis causas "níveis de autoexigência e de respeito à autoridade do professor que não existem no mundo ocidental, e que supõem resultados melhores com o mesmo esforço público em educação".
Para quem, como eu, estudou em escola pública a vida toda, parece ponto essencial: devolver ao professorado o respeito reverencial que tínhamos por eles, além, como é óbvio, de salários dignos.
Fonte: Folha, 05.12.13.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Países ricos gastam 3 vezes mais do que Brasil em educação: Desenvolvidos também têm PIB per capita superior e mais recursos para tudo, não só para ensino, afirma economista

Relatório diz que Brasil precisa investir mais; para especialistas, problema não é só dinheiro, mas gestão
DE SÃO PAULODE BRASÍLIA
Os países desenvolvidos membros da OCDE gastam três vezes mais no ensino de alunos de 6 a 15 anos em relação ao Brasil, de acordo com relatório do Pisa (exame internacional de educação).
O documento divulgado ontem diz que o país precisa investir mais nas escolas em áreas de baixo desenvolvimento socioeconômico.
Especialistas afirmam, porém, que não são apenas os recursos que explicam a má qualidade do ensino --a gestão também é um problema.
"O importante é tirar o máximo proveito dos professores, fazer avaliação de desempenho e premiar os melhores docentes", afirma o economista Naercio Menezes Filho, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper.
Segundo o Pisa, o Brasil gasta em média U$S 26,7 mil (R$ 64 mil) para educar uma criança dos 6 aos 15 anos. Esse gasto chega a U$S 83,4 mil (R$ 200 mil) nos países mais ricos da OCDE (entidade que reúne países desenvolvidos e que organiza a prova).
Menezes Filho ressalta que os países desenvolvidos têm mais recursos como um todo, não apenas para educação.
Assim como no gasto com o ensino, o PIB per capita deles também é três vezes superior ao do Brasil.
O nosso PIB per capita é igual a U$S 12,5 mil (cerca de R$ 30 mil). Nos países membros da OCDE, o valor é de U$S 33,7 mil (R$ 84,5 mil).
Essa conta foi um dos principais argumentos do governo para reforçar o salto do país em matemática --ainda que o Brasil continue entre os últimos do ranking.
"Estamos fazendo muito mais com menos", afirmou ontem o ministro Aloizio Mercadante (Educação).
Mercadante, entretanto, tem afirmado que o país deve gastar mais com a área.
A posição foi posta, por exemplo, ao defender que todos os royalties do petróleo fossem para a educação --a lei sancionada destinou 75% para esse setor.
"Precisamos, sim, de ampliação de recursos, mas com excelência de gestão", avalia Priscila Cruz, da ONG Todos pela Educação.
O relatório do Pisa faz uma relação positiva entre mais investimentos e melhores índices de educação.
Essa relação, porém, nem sempre aparece. A Turquia, por exemplo, tem um PIB per capita 25% maior do que o brasileiro, investe 27% menos em educação e está 14 posições à frente em matemática, em 44º lugar na lista de 65 países. O Brasil ocupa o 58º lugar na mesma fila.
Fonte: Folha, 04.12.13.

Avanço não indica melhora nas políticas de educação: Parte do ganho brasileiro se deve a mudanças no perfil social de alunos


ENTRE OS MELHORES ALUNOS, NÃO HOUVE AVANÇO; PERMANECEM NO NÍVEL INTERMEDIÁRIO DA PROVA DE 2003
PAULA LOUZANOESPECIAL PARA A FOLHA
Entre as edições de 2003 e 2012 do Pisa, o Brasil aumentou 35 pontos em matemática e foi o país que mais avançou no período.
No entanto, uma análise mais cuidadosa do nosso desempenho esconde a verdadeira tragédia do sistema educacional brasileiro.
Apesar desse crescimento, quase 70% dos nossos jovens não sabem suficientemente matemática para continuar aprendendo na escola ou mesmo competir no mercado de trabalho, segundo padrões da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que reúne países industrializados).
Isso porque eles não são capazes, entre outras coisas, de usar a informação de uma tabela ou de um gráfico para calcular uma média ou uma tendência.
É ainda mais grave constatar que 23% dos brasileiros de 15 anos não participaram do Pisa. Esta é a parcela de jovens que estão fora da escola ou têm mais de dois anos de atraso escolar.
Ou seja, se todo esse contingente estivesse na escola como deveria, os resultados brasileiros poderiam ser ainda piores.
Além disso, como comemorar os pontos ganhos no Pisa se o aumento na nota brasileira se deu com maior força entre os piores alunos, cuja nota média na edição de 2003 equivalia a zerar na prova, e hoje, quase dez anos depois, esse mesmo grupo ainda não é capaz de ler uma única informação em um gráfico de barras?
As análises do Pisa mostram que metade do ganho brasileiro se deveu a mudanças no perfil social dos alunos, e não a um conjunto de iniciativas para melhorar o ensino da matemática.
Aliás, a falta de políticas públicas específicas fica patente na análise dos nossos melhores alunos: entre eles, não houve nenhum avanço e permanecem no mesmo nível intermediário que estavam em 2003.
Ou seja, não são capazes, em sua maioria, de calcular os juros de uma compra.
Os dados do Pisa trazem informações valiosas para os gestores dos sistemas educacionais de todo mundo. É hora de nos debruçarmos sobre eles, como fazem os países desenvolvidos, e buscarmos soluções estruturais para os nossos problemas crônicos.

Brasil melhora em matemática, mas segue entre piores do mundo: País liderou avanço em exame internacional em nove anos, mas tendência perdeu força após 2009

Desempenho não foi suficiente para tirar Brasil das últimas colocações --em 58º lugar entre 65 países
FÁBIO TAKAHASHISABINE RIGHETTIDE SÃO PAULOFLÁVIA FOREQUEDE BRASÍLIA
O Brasil é o país em que os alunos mais avançaram em matemática nos últimos nove anos. Ainda assim, segue entre os piores do mundo --e a melhoria perdeu força entre 2009 e 2012.
O panorama está presente nos resultados do principal exame internacional da educação básica, o Pisa, que avalia alunos de 15 e 16 anos em matemática, leitura e ciências (idade referente ao ensino médio brasileiro).
A média do Brasil em matemática subiu de 356 para 391 pontos (ganho de 9,8%) entre 2003 e 2012. No período, a média dos países ficou estável --foi de 486 para 487.
É como se o aluno brasileiro de agora tivesse quase um ano a mais de escolarização do que o de 2003.
O desempenho, porém, não foi suficiente para tirar o país das últimas colocações. Está em 58º lugar, entre 65 países, atrás de Cazaquistão, México e Uruguai. E à frente de Colômbia e Jordânia.
A maioria dos alunos brasileiros não consegue acertar uma questão em que é preciso apenas interpretar dados num gráfico com barras, sem necessidade de cálculos.
Outro problema é que, apesar do forte crescimento em nove anos, o ritmo desacelerou recentemente. Se de 2006 para 2009 o avanço foi de 16 pontos, no triênio seguinte caiu para 5. A prova é aplicada a cada três anos.
O relatório da OCDE (entidade que reúne países desenvolvidos e organiza a prova) afirma que cerca de metade do ganho na média entre 2003 e 2012 se deve às melhorias socioeconômicas no país. A outra metade coube a melhorias no sistema de ensino.
DEBATE
"Nossa fotografia ainda não é boa e não temos que nos acomodar. Porém, o nosso filme é muito bom", afirmou o ministro da Educação, Aloizio Mercadante.
Cabe à União induzir políticas de melhoria nas redes --mais de 80% dos alunos estão em escolas estaduais.
Para o ministro, as Olimpíadas da Matemática foram um dos fatores que ajudaram a melhorar as notas na área. "Isso gera autoestima."
Diretora-executiva da ONG Todos pela Educação, Priscila Cruz diz que tem mobilizado as escolas em divulgação de dados que mostram problemas na disciplina.
O pesquisador Naercio de Aquino de Menezes (do Insper e da USP) destaca que o país tinha condições de dar um salto porque o desempenho era muito baixo. "Só recuperamos o atraso."
O Consed, conselho que reúne os secretários estaduais de Educação, diz ser difícil eleger uma iniciativa como explicação, pois há ações espalhadas pelos Estados.
PÚBLICO x PRIVADO
Avaliadas separadamente, as redes federal e particular têm desempenhos melhores que a média brasileira. As federais têm desempenho compatível com a média da Itália (32º). Já as particulares são compatíveis com Israel (41º).
Em leitura, o Brasil está em 55º e, em ciências, em 59º. As três matérias são avaliadas, mas nesta edição o foco das análises foi matemática.
Nas duas disciplinas, o país também melhorou se considerado os nove anos, mas o avanço perdeu força. Cerca de 20 mil alunos brasileiros fizeram a prova.

Britânicos compram Yázigi, Wizard e Skill por R$ 1,95 bi: Pearson adquire de Carlos Wizard a maior rede de escolas de inglês do Brasil

Grupo que edita o jornal 'Financial Times' já havia adquirido no país o sistema COC e fatia na Companhia das Letras
MARIANA BARBOSARICARDO MIOTODE SÃO PAULO
Autor do best-seller "Desperte o Milionário que Há em Você" (Gente), Carlos Wizard Martins vai se aposentar com R$ 1,35 bilhão no bolso.
O empresário que começou dando aulas de inglês em casa em Campinas e construiu a maior rede de escolas de idiomas do país, com 2.600 unidades das bandeiras Wizard, Yázigi e Skill, entre outras, vendeu a totalidade do Grupo Multi para o grupo britânico Pearson por R$ 1,95 bilhão.
É uma demonstração de que, no mercado de educação, o Brasil segue desejado pelos investidores estrangeiros.
A busca por instrução da nova classe média justificou, em agosto, a compra da FMU pelo grupo americano Laureate. Agora, as aquisições estrangeiras chegam ao mercado de ensino de línguas.
"Menos de 3% dos brasileiros falam inglês com proficiência", diz Juan Manuel Romero, presidente da Pearson para a América Latina.
Com a compra, o grupo britânico entra também no setor de franquias, que cresceu a uma média de 12% ao ano desde 2001. A Wizard foi a primeira escola a ter mais de mil unidades franqueadas pelo país.
Do total, R$ 250 milhões são dívidas assumidas. Outros R$ 350 milhões vão ao Kinea, gestora de fundos do Itaú que comprou 22% do Multi há três anos, por R$ 200 milhões.
A Pearson não é novata no mercado de ensino brasileiro. O grupo comprou em 2010 os sistemas COC, Dom Bosco, Pueri Domus e Name, adotados em mais de 2.000 escolas.
Os britânicos editam ainda o jornal "Financial Times" e detêm, por meio da Penguin, 45% da Companhia das Letras.
MÓRMON
O vendedor, Martins, 57, dsse que só vai pensar no seu futuro em 2015. Ele teve uma história de vida peculiar. De origem simples, aprendeu inglês com missionários mórmons. Concluiu o ensino médio com um supletivo. Aos 26, foi estudar na Universidade Brigham Young, em Utah, também da Igreja Mórmon.
Estudou computação e voltou ao Brasil. Começou a dar aulas de inglês para complementar a renda, caminho que o levou a abrir uma escola.
Tanto Martins quanto os filhos já tinham saído da direção do Multi havia mais de um ano estavam apenas no conselho de administração. A Pearson, assim, manterá toda a atual diretoria do grupo.
O Multi deve faturar, em valores brutos, R$ 3 bilhões neste ano, considerando receitas dos franqueados. Em 2012, o lucro operacional foi de R$ 130 milhões. A Pearson espera crescimento de dois dígitos nos próximos anos.
O mercado de aprendizado de inglês no Brasil é estimado em R$ 7,3 bilhões. São 2,8 milhões de alunos, 800 mil em escolas do Grupo Multi.
Com a conclusão do negócio, o Multi administrará a rede Wall Street English (WSE), bandeira do grupo Pearson focada na classe A e com apenas quatro escolas no Brasil.
Para o presidente do Multi, Giovanni Giovannelli, a WSE complementará o portfólio. No médio prazo, o plano é de expansão para o exterior, onde a Wizard tem 20 franquias.
Apesar do sotaque britânico dos novos donos, as escolas seguirão com o inglês americano. "Ele é mais aceito no mercado daqui", diz Romero.
Fonte: Folha, 04.12.13.